domingo, 31 de maio de 2009

Jacinto, Bilia e Ceguinha...



São Luiz Gonzaga é uma daquelas típicas cidades do interior gaúcho com suas peculiaridades únicas. O povo sãoluizense é muito acolhedor, mas o modo de viver e enxergar as coisas é único.Eles tem suas crenças, manias e até lendas urbanas.
Muitas edificações antigas, prédios com arquitetura típica do início do século passado, a Igreja Matriz e a praça centralizando tudo.Um cinema,Lux se não me engano,muitas famílias de estancieiros que intercalam a moradia na cidade e na fazenda,e finalmente alguns personagens que embora obscuros e já desaparecidos,fazem parte do imaginário inconsciente de quem viveu ou ainda mora lá.
O Jacinto (inclusive minha amiga virtual Tita Ruschel tem um dvd chamado "Jacinto,um anjo na Terra1") e a Bilia, apelido de Maria Delfina,ou também Maria Louca.
Jacinto era um doce de pessoa, afável,engraçado e amado pela população vivia de doações. Lembro que o café da manhâ era fornecido pelos meus avós, que permitiam sua entrada até um galpão nos fundos da casa para comer.Eventualmente em dias de chuva ele podia se abrigar lá. Prestativo, quando avistava alguém chegando em casa, corria e abria o portão e esperava algum trocadinho. Dizia todo mês que estava de aniversário para ganhar presente.
Já a Bilia,uma morena com o cabelo sarará, tinha um perfil agressivo e era temida por todo mundo.A arma que tinha era um guarda-chuva que usava para "pontiar" quem cruzasse seu caminho.Só tinha medo de homem sem camisa.Nas paradas de 7 de setembro era um espetáculo à parte. Com um andar marcial desfilava por último e fazia mais sucesso que o batalhão do exército.
Outro personagem inesquecível da cidade, só que essa ainda viva,é a ceguinha.Muitas dúvidas pairavam sobre a deficiência visual da moça. Hoje idosa,ainda a vejo aqui em Santo Ângelo, geralmente na frente do Banco do Brasil,com seu companheiro,que reza a lenda é seu próprio irmão,que fala uma linguagem incompreensível,uma espécie de mandarim com árabe em uma velocidade altíssima.
São obscuros personagens que peregrinam no imaginário das Missões fazendo o caminho inverso de outros que viram nome de rua...

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Muitas voltas...







O ônibus que me trazia para Santo Ângelo era o detestável pinga-pinga. Geralmente saia as oito horas de São Miguel e chegava às dez horas na Capital das Missões.Mas eu não reclamava.Apenas aproveitava a paisagem tão familiar.Desde criança, quando ainda morava em São Luiz Gonzaga fazia esse percurso.As curvas sei de cor. Os rios, as fazendas, tudo tão familiar embora nunca tenha realmente estado lá. Apenas o cheiro. Único, inconfundível cheiro das Missões. O roteiro era exatamente o mesmo. Descia no trevo da Av. Ipiranga, caminhava até a parada de ônibus, pegava o coletivo e ia parar na Praça Pinheiro Machado.Daí aquele deslumbramento de sempre. Parecia que eu nunca havia olhado para ela. Deslumbrante, imponente e com aquela aura de misticismo talvez herança dos nossos ancestrais guaranis. A Catedral estava ali. A escadaria, as torres, o interior e o Cristo Morto. O entorno da igreja com seus vendedores de pipoca e gentes apressadas em atividades diversas passando sem dar a mínima para aquela maravilha. Pensava comigo “tomara que não precisem se afastar daqui”. O cheiro, o aroma da cidade é privilégio único para quem se afasta e depois retorna. Ele invade sem pedir licença pelas vias respiratórias, mas em vez de ter os pulmões como objetivo, atinge como uma flecha, imagino aquelas que os índios usavam para a caça, o coração de quem nasceu aqui. Geralmente eu vinha com pressa e com muitas tarefas e algumas visitas, mas nada me fazia deixar de absorver aquela aura que envolve a Catedral. Tinha que retornar às três e meia, mas não havia problema.Meus olhos retiveram as imagens e a fixaram até a próximo encontro,afinal, eu ainda teria muitas voltas...