domingo, 1 de agosto de 2010

Em carne viva XV !




Os olhos de minha mãe estavam maiores que de costume, e segurava minhas mãos como que para eu não fugir.

-Por favor, filho. Diz que não tens nada a ver com essa coisa toda.

Ela era provavelmente a única pessoa que eu poderia me abrir e contar tudo, mas eu não tinha a menor vontade de fazer isso. Não falar talvez fosse a melhor resposta que eu poderia dar a ela. Não consegui mais ficar ali e fui tentando me desvencilhar enquanto ela ficava cada vez mais alterada.

- Tu vais estragar a tua vida. A polícia vai aparecer amanhã aqui e com certeza vão te procurar. Tu achas que eles são burros? Que não vão saber da tua ligação com essa mulher?

Eu estava realmente preocupado. A sensação inicial de uma aventura, agora era de medo. Mas nada me faria falar, eu havia decidido isso durante toda a madrugada em claro, junto a janela da cozinha. Os barulhos dos grilos e corujas pareciam mais que nunca amigáveis. Um vaga-lume voava nas proximidades do pé de bergamota. Ali era meu porto seguro, mas isso agora estava ameaçado, quem sabe se eu fugisse? Ouvi falar que em Ijuí, pequenas indústrias estão em ritmo acelerado de crescimento e sempre precisando de gente. Mas se saísse dali fugido seria como assinar minha culpa.
O alvoroço na vila era total. Quando Polozzi voltou para casa depois de dois dias na casa da amante, deu por falta de Cecília. Inicialmente deve ter imaginado que a mulher se rebelara mais uma vez e saído da clausura. Ao final da tarde e início da noite ele começou a procurá-la nas redondezas. Buscou informações nos vizinhos, e esteve até aqui em casa. Ouvi tudo de meu quarto. Meu pai foi seco com ele e Polozzi me acusou de estar envolvido nisso. Papai rebateu mandando que se retirasse do nosso pátio.

Faltou coragem para sair do quarto, de encarar meu pai. Não demorou e ele foi até a porta e me perguntou do seu jeito, muito objetivo:

- O que está acontecendo?

Eu podia tentar enrolar, mas sabia que era como provocá-lo.

-É loucura desse gringo. - menti.

Ele me olhou por longos segundos, como que a esperar que alguma expressão me traísse. Depois virou as costas e saiu. Ele sempre fazia isso quando se incomodava com algo. Ia para junto da horta e acendia o cigarrão de palha.

Eu tinha dois problemas imediatos. A polícia com certeza era um deles. Mamãe tinha razão. Os últimos fatos certamente os conduziriam a mim. Iriam pressionar para que eu falasse algo que os levasse ao paradeiro da mulher. Havia também a possibilidade do Polozzi armar outra emboscada junto a seus alcaides.

O círculo começou a se fechar.

3 comentários:

Anônimo disse...

Boa saída, Fábio! Eu achei que o guri fosse atacar o Polozzi, como o Roberto sugeriu num outro comentário. Mas o sumiço da mulher vai te dar um bom fôlego para os próximos capitulos. Bem pensado!

roberyk disse...

Ótimo Fabio. Concordo com o Zé, deste uma excelente reviravolta na trama. Agora a pergunta que fica é "Onde estará Cecília?".
Bela tangente, muito bela.

Gisele Cunha disse...

Otimo história. Parabéns!